Em um teatro lotado de integrantes da Justiça do Trabalho, coube ao ministro do Superior Tribunal de Justiça Luis Felipe Salomão (foto) falar sobre a questão do conflito de competência entre a Justiça comum e a especializada.
Em um bate-papo com a desembargadora Ana Paula Pellegrina Lockman, do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, o ministro respondeu às questões por ela levantadas. Eles participaram, na manhã desta sexta-feira (6/6), do 14º Congresso Nacional de Direito do Trabalho e Processual do Trabalho do TRT-15.
No início de sua exposição, o ministro observou que a construção da jurisprudência no STJ, em todas as matérias, é afinada com os avanços sociais, fazendo muitas vezes um papel contramajoritário.
Salomão lembrou que, assim como o resto da sociedade, as relações trabalhistas também evoluíram: "A relação atual do trabalho ultrapassa, e muito, a visão restrita do contrato de emprego que permeou toda a lógica que criou a Justiça do Trabalho e a desenvolveu".
Ao falar sobre a ampliação da competência da Justiça do Trabalho, o ministro fez uma breve análise da evolução da Constituição, recordando que desde 1946 até a Constituição Federal de 1988 foi utilizado um critério subjetivo para estabelecer a competência da Justiça do Trabalho. Segundo ele, isso só foi alterado após à Emenda Constitucional 45, que trouxe significativa ampliação da competência dessa Justiça especializada, com critérios objetivos.
"Hoje os tribunais vêm compreendendo mais bem essa ampliação. Hoje se tem a nítida a ideia de que a relação de trabalho envolve direta ou indiretamente todo trabalho humano, decorrente ou não do vínculo de emprego", explicou. Para Salomão, a ampliação é um caminho sem volta.
Segundo o ministro, o Superior Tribunal de Justiça demorou um pouco a entender a extensão da mudança feita pela EC 45. "Tanto é verdade que a Súmula 366 do STJ, que trata da ação indenizatória do cônjuge e filhos do trabalhador falecido para ingressar com ação indenizatória, não durou um ano. Foi editada e logo depois revogada porque se percebeu o erro de que não é o tipo de lei que se vai aplicar que vai ditar a competência. O que vai estabelecer a competência é a relação subjacente. Se decorrer da relação de trabalho, a competência é sempre da Justiça do Trabalho", exemplificou.
Outro exemplo citado pelo ministro para demonstrar a demora no STJ em entender a ampliação da competência da Justiça do Trabalho é a Súmula 363, que diz: "Compete à Justiça estadual processar e julgar a ação de cobrança ajuizada por profissional liberal contra cliente".
Para Salomão, essa súmula deve ser revista ou revogada. Ele cita que, em decisão recente, a 2ª Sessão do STJ, por um placar apertado, já entendeu que a competência, nesse caso, é da Justiça do Trabalho.
"Quando o empregado tem que contratar advogado para ajuizar ação reclamando seus direitos na Justiça do Trabalho, eu creio que a competência para julgar a causa indenizatória, inclusive os honorários de contratação do advogado, é da própria Justiça do Trabalho", explica.
O ministro destaca que não faz sentido ser ajuizada uma nova ação na Justiça estadual, pois a lógica de fixação de honorários na Justiça do Trabalho é completamente diferente. "Nós temos uma lógica baseada na sucumbência e a lógica da Justiça do Trabalho é outra".
Outro ponto que, para o ministro, o Superior Tribunal de Justiça deve fazer é relacionada aos representantes comerciais autônomos. Segundo ele, a jurisprudência hoje do STJ é que compete à Justiça comum julgar casos relacionados aos autônomos. Mas é preciso mudar esse entendimento.
"É um avanço necessário que teremos que fazer. Se concluimos que a Constituição quis atribuir à Justiça do Trabalho toda e qualquer causa que diga respeito à relação do trabalho, parece-me que o profissional liberal e o representante autônomo devem ser julgados pela Justiça do Trabalho".
O ministro observou que o Supremo Tribunal Federal já reconheceu a repercussão geral sobre esse tema.
Recuperação judicial
Ao falar sobre recuperação judicial, o ministro explicou que a lógica é diferente da do juiz do Trabalho quando se analisa uma reclamação. Ele conta que, enquanto o juiz do Trabalho quer fazer valer o direito reconhecido do empregado, o juiz da recuperação tem a visão de salvar a empresa.
"A jurisprudência do STJ foi construída com base na lógica da salvação da empresa. O juiz da recuperação acredita que a manutenção da empresa garante empregos, garante o pagamento aos credores, a economia".
O ministro observou que, com base nessa proteção à empresa, o STJ entendeu que o prazo de 180 dias de suspensão das ações e execuções contra empresas em recuperação judicial não é peremptório. Salomão concluiu dizendo que se o Judiciário permite o ataque ao valor da massa da empresa em recuperação judicial, nenhuma empresa conseguirá se recuperar.
Previdência complementar
Questionado sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal que reconheceu a competência da Justiça comum para ações envolvendo previdência complementar, o ministro considerou correta.
"Nós temos sido bem conservadores. Se não tivermos a noção que o fundo é de todos que compõem o fundo, e não particularmente deve beneficiar a um ou a outro assistido, os fundos quebram", explica.
Segundo o ministro, essa relação com os fundos de previdência complementar não está relacionada com o vínculo jurídico da relação do trabalho.
Por Tadeu Rover
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